sexta-feira, 6 de abril de 2012

Primordial - Entrevista


PRIMORDIAL

DA MORTE À REDENÇÃO



            Entrevista feita por Jorge Ribeiro de Castro (Versus Magazine)



Com uma carreira de mais de vinte anos, vários álbuns editados e algumas dores pelo caminho, Primordial apresenta em 2011 uma nova carga de adrenalina que revela que a inspiração não lhes traz descanso. Porque a qualidade é uma das melhores facetas deste agrupamento, aqui ficam as respostas intuitivas e filosóficas de Alan “Nemtheanga” Averil.





Saudações. Primeiro que tudo gostaria de congratular Primordial por um álbum soberbo. Sendo fã desde os anos 90, faz-me bem saber que ainda são uma banda muito motivada, capaz de criar canções tão fervorosas. No entanto, houve um período em que não se sentiram assim… Quão difícil foi de ultrapassar os problemas que a fama traz e o delírio momentâneo de ver a banda quase a fenecer após tantos anos a trabalharem juntos como uma tribo de irmãos de sangue? A morte nunca é uma experiência bonita quando a fé abala…

Parece simples mas a vida é a vida. Acontece, temos baixos e altos. Alguns de nós aguentam melhor com o facto de estarem numa banda do que outros. Há sempre tentações, algumas vezes é como viver numa realidade alternativa e perdermo-nos pode ser fácil. Tivemos alguns momentos sombrios e não penso que a escuridão irá desaparecer para sempre mas talvez precisamos disso por vezes de modo a ganharmos algum discernimento e perspectiva.



Sendo designados por várias pessoas como uma banda Pagan/Folk, são, no entanto, mais invulgares do que muitos por aí afora, estes tendo sido enquadrados naquela tela pagã (de alguma forma influenciada pelo power-metal) muito mais tarde após vocês aparecerem. Como essa designação é uma extensa definição de muitas bandas, o que é que Primordial considera ser e representar embora exista clara inspiração nas raízes folclóricas irlandesas?

Para ser honesto, tal é apenas jornalismo preguiçoso. As pessoas fazem pressupostos baseados no que ouvem dizer. É óbvio que temos algumas referências aqui e ali, em alguns dos álbuns mais antigos, ao “paganismo” ou a um ponto de vista pagão ou a elementos de folclore em duas canções, que eu uso como metáforas para a vida moderna mas nada mais. Temos algumas influências da música tradicional irlandesa mas Primordial não é uma banda folk ou pagan metal. É sobre o aqui e o agora, usamos a história verídica de modo a vir com pontos de referência modernos. Não há fantasia ou escapismo. Claro que temos fãs dentro dessa cena e temos este sentimento Pagão que é importante mas existe muito de cinzento nas tonalidades de preto e branco.



Sentem-se um pouco postos de parte, em relação ao aspecto promocional, pelas editoras que assinaram ou pela imprensa Metal já que, quase duas décadas após aparecerem na cena, tiveram uma melhor oportunidade, através da Metal Blade, para serem conhecidos como uma das melhores bandas de Metal actuais? Afinal de contas, vocês nunca mudaram o vosso som ou tiveram menos qualidade, apenas melhoraram-na, pena que teve de ser uma certa moda que os fizeram ser mais conhecidos…

Possivelmente. Sempre pensei que merecíamos mais do que recebemos mas o que vai, volta e talvez fosse melhor termos “crescido” devagar do que sermos um sucesso instantâneo como alguns dos nossos pares. Não é apenas a cena pagan metal que nos segue mas também os fãs do metal mais mediático. É melhor não viver com remorsos e olhar sempre em frente.



A escrita para um novo álbum é sempre stressante embora seja uma grande força motivadora para uma banda. Ouvindo “Redemption…”, parece que, embora seja chamado do álbum da “morte”, ainda existem os gritos de revolta que inflamam o espírito. Será que Primordial considera-o a sua própria redenção por deixarem os erros comuns de ser-se humano perturbar a banda? Será que, como letrista, consideras este álbum o teu próprio “requiem” ou, se não existe “luz” neste planeta, o do mundo?

Difícil de dizer. Suponho que, em muitas maneiras, os eventos dos anos passados colocam esta moldura redentora à volta do mundo mas isto faz sentido de várias formas. Todos nós procuramos por alguma forma de redenção dos nossos impulsos naturais para fazer o que a sociedade nos disse ser errado ou injusto. Esta é uma procura de redenção e também de revelação de modo a que tudo faça sentido num contexto “espiritual”.



O conhecimento de um homem acerca do mundo ao redor dele faz com que seja um melhor juiz de si próprio embora tal poderá não trazer um final feliz… Um grande poeta e escritor português do inicio do séc. XX, Mário de Sá Carneiro, lidava com questões relacionadas com a mortalidade, cometendo suicídio aos 26 anos. Um dos seus livros, A Loucura – narra os seus medos de envelhecer… Assim, desde a criação de Primordial, quanto dos eventos mundiais e lições de história, inspiraram-te para escrever as líricas? Quanto foi retirado de ti de modo a dispersares pensamentos e emoções… até medos, de modo a ajudar-te a avançar?

Penso que é essencial em tudo. É a minha catarse e também o meu diário pessoal e muito público. Ajuda-me a aguentar de alguma forma com essas emoções tal como o faz de maneira esperançosa com o ouvinte. Tudo o que posso escrever advém da minha perspectiva, como me comprometo com o mundo à minha volta.



Embora a capa pareça minimal, na minha opinião o símbolo descreve perfeitamente o que se pode esperar quando se ouve o álbum: o temor que malha a luz. Quem o desenhou e o que representa exactamente?

Pertence a uma série de seis partes, a memento mori do século XVII como considero ser. Sempre me senti atraído por estas imagens medievais da pós-reformação e xilogravuras que lidam com a morte. Originalmente, queria-a como uma tatuagem mas começou a fazer mais sentido como capa do álbum. Adicionamos a mão no meio, isto representando o puritanismo e a tentação.



Têm um dvd editado, “All Empires Fall”. Pode ser difícil ser objectivo como estão por “dentro” mas pensam que o esforço posto na sua produção captura mesmo bem o que a banda deseja transmitir no formato ao vivo?

Pessoalmente, penso que é um dos melhores dvd de espectáculo alguma vez editados e eu digo-o sinceramente. Os ângulos de câmara e estilo em que é filmado são sem qualquer dúvida algo novo e inovativo e pode aguentar visualizações repetidas. Até agora, todos parecem tê-lo apreciado.



Poderá haver um fim amargo mas a vossa música está longe disso. Agradeço as respostas e desejo-vos tudo de bom. Espero vê-los em Portugal o mais depressa possível. Keep the spirit inflamed!!!

Como sempre. Alegria e força. Bloodied yet unbowed to the bitter end.

entrevista publicada na "Versus Magazine"

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